domingo, julho 03, 2005

Poema de muito amor

Ó meu amor minha raiva
meu sol posto a rubro
numa praça

minha voragem meu barco
minha vingança de mar
onde me perco e me mato

Ó suicídio Ó silêncio
Ó beber pelos teus braços
respirar a tua boca
precipício que desato

Ó corpo que sei ser meu
mas que me foge
e não toco

que voragem de dizer
que prazer que não invoco
de te pensar e morrer
de só te ter pouco a pouco

Ó ódio de bem te querer
Ó ternura de ser tua

Ó vontade de correr
contigo no meio da rua

Ó meu amor - desdizer
Ó meu crime de mentira

viagem - mito - prazer
meu interior de colina

Que grito mais rasgado se domina
que medo transformado numa espada
que casa mais secreta e mais vazia
que água mais domada e mais amarga

Minha ferida - consciência
minha loucura encontrada

como arma de gatilho
pronta a me ser disparada

Ó alegria Ó veneno
Ó ódio de me seres tudo
verdade de eu nada ser
na construção do teu mundo

Que fogo inquieto não
iludo
que certeza encontrada
não pergunto

que fuga não domino
e porque luto

que dor não domino
e que desfruto

Ó noite não somente
e também dia
Ó rio não somente
e também corpo

Ó febre não somente meu limite
mas minha invenção
e meu desgosto

Minha evasão - meu país
meu habitar muito lento

Ó meu amor meu invento
meu futuro a destruir
em negação do seu tempo

(Maria Teresa Horta, n 1937, Portugal
in "Minha Senhora de Mim", 1971)