Gosto de me sentar na Vila Maria
nas tardes de domingo
E gosto, nas tardes de domingo
na Vila Maria
do rumor da brisa na casa número seis.
Gosto do quintal amplo, de barro escuro
onde o verde do xapo-xapo é mais puro
e a polpa mais macia, mais algodão
Bananeiras alinhadas como soldados
carambolas, pitangas, maracujás
e os ramos das goiabeiras estendidos
como mãos
Gosto da bananeira-flor, à entrada
erecta como um guardião
da simetria do seu leque
aberto em oferta
e da sombra que cai a pique
sobre a relva
Há um cheiro vegetal, de pomar
mesmo se a maresia atravessa o ar
na Vila Maria número seis
Gosto da azáfama de domingo nas traseiras
quando na gamela a lussúa é promessa
e p'los degraus de pedra perpassam gestos e pressa
O crepitar da brasa no fogão
as últimas ordens o frémito da festa
e o vulto de Aíto reclinado no cadeirão
Gosto da inesperada saudação
de nhô N'Tóni
De longe, desde o portão
seu gesto antigo de chegar
seu cantante falar
de Santo Antão
pejado de sussurros e secretas novas
e o aguardado modo de puxar a cadeira
para com Nanda partilhar a refeição
Gosto das tardes de domingo
na casa número seis da Vila Maria
onde as horas se repartem como gomos
iguais
e os encontros têm a conivente magia
dos rituais.
(Conceição Lima, n 1961, S. Tomé e Príncipe
in "O Útero da Casa", Editorial Caminho, 2004, Lisboa)