Venturosa de sonhar-te,
à minha sombra me deito.
(Teu rosto, por toda parte,
mas, amor, só no meu peito!)
–Barqueiro, que céu tão leve!
Barqueiro, que mar parado!
Barqueiro, que enigma breve,
o sonho de ter amado!
Em barca de nuvem sigo:
e o que vou pagando ao vento
para lever-te comigo
é suspiro e pensamento.
–Barqueiro, que doce instante!
Barqueiro, que instante imenso,
não do amado nem do amante:
mas de amar o amor que penso!
(Cecília Meireles, 1901-1964, Brasil
in "Melhores Poemas", Global Editora, 1984, SP)