quinta-feira, janeiro 06, 2005

Eu

Até agora eu não me conhecia.
Julgava que era Eu e eu não era
Aquela que em meus versos descrevera
Tão clara como a fonte e como o dia.

Mas que eu não era Eu não o sabia
E, mesmo que o soubesse, não o dissera...
Olhos fitos em rútila quimera
Andava atrás de mim...e não me via!

Andava a procurar-me -- pobre louca!
E achei o meu olhar no teu olhar,
E a minha boca sobre a tua boca!

E esta ânsia de viver, que nada acalma,
É a chama da tua alma a esbrasear
As apagadas cinzas da minha alma!

(Charneca em Flor
Florbela Espanca, 1894-1930, Portugal)