Lá no horizonte
o fogo
e as silhuetas escuras dos imbondeiros
de braças erguidos.
Na ar o cheiro verde das palmeiras queimadas.
Poesia africana.
Na estrada
a fila de carregadores bailundos
gemendo sob o peso da crueira.
No quarto
a mulatinha de olhos meigos
retocando o rosto com rouge e pó de arroz.
A mulher debaixo dos panos fartos remexe as ancas.
Na cama
o homem insone pensando
em comprar garfos e facas para comer à mesa.
Na céu o reflexo
do fogo
e as silhuetas dos negras batucando
de braços erguidos.
Na ar a melodia quente das marimbas.
Poesia africana.
E na estrada os carregadores
no quarto a mulatinha
na cama o homem insone.
Os braseiros consumindo
consumindo
a terra quente dos horizontes em fogo.
(Agostinho Neto, 1922-1979, Angola
in "Poemas", Cadernos Capricórnio 28/29
Opal, Lobito, 1975)